terça-feira, 27 de março de 2007

Contos Anunciados (1)

Lourel? Ele é bastante mais velho, sim, mas ela ama-o, e di-lo com um misto de orgulho e raiva aos pais chocados, que primeiro lhe gritaram, depois a ameaçaram, e por fim já só choram.
Lourel? Ele é engraçado, muito engraçado, e leva-a a restaurantes com doses pequenas e preços grandes, e ela veste um dos dois vestidos que ele lhe deu - o preto, com o decote - e ela ri-se toda a noite com as histórias dele, mesmo com as historias da tropa.
Lourel? Ele deixou a mulher, e também os filhos, mas ele tem a certeza que pelo menos um deles é do patrão, ele fez tudo para salvar o casamento, como fez tudo para salvar o casamento anterior, como fará tudo para salvar este casamento, quando acontecer, e ela quer um vestido lindo, pérola, e uma aliança daquelas quadradas de ouro branco.
Lourel? Ele disse-lhe que queria os olhos dela reflectidos no mar ou num rio ou nas folhas verdes de um pinhal imenso, e ela começou a desenhar móveis que encaixassem em quartos pequenos numa das colinas de Lisboa, ou em salas enormes na Linha de Cascais, mas ele guarda para si a localização do ninho, ele é o Pirata que tem o mapa, enquanto ela só pode tentar adivinhar o X.
Lourel? Ele aponta para duas árvores e faz daquilo um pinhal, ela não para de olhar para a porta e imagina que quando a abrir vai ver um rio - um rio qualquer - ou sentir o cheiro do mar, ele apresenta o mesmo sorriso de sempre, mas ela vê-o agora como diabólico, e roga pragas a si mesma, até começar a chorar quando a senhora da agência imobiliária lhe diz que a casa está "impecável".
Inspirado no anúncio:
"Lourel/ Sintra. T2 duplex, 120m², Impecável, óptima oportunidade" Jornal da Ocasião, 27/03/2007

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